No combate à Covid-19 as IPSS têm sido um elemento essencial na proteção de um vasto número de pessoas, que integram o grupo de maior risco, para que não inundem hospitais e morgues. Até agora a resiliência das instituições, alicerçadas no desempenho e dedicação abnegada dos seus trabalhadores tem conseguido travar o vírus e evitar uma calamidade humana (basta olhar para Espanha!). Os dirigentes não negam elogios aos profissionais das instituições, ao mesmo tempo que reclamam por mais equipamento de proteção individual e por um olhar mais atento do Governo para o pernicioso que este período está a ser para as contas das IPSS que já estavam muito frágeis. Duas semanas volvidas sobre o início do estado de emergência em Portugal e, sensivelmente três desde que as autoridades começaram a tomar medidas efetivas e os portugueses se resguardaram em casa, o SOLIDARIEDADE fez uma ronda por todos os distritos do território continental para sentir o pulso às IPSS. Sabendo-se que a Covid-19 tem uma letalidade elevada junto das pessoas acima dos 60 anos, ainda mais dramática ainda acima dos 70, olhando-se aos cenários dos países vizinhos e, especialmente em Espanha e França no que toca aos lares de idosos (à hora de fecho desta edição os relatos davam conta de que a situação em Inglaterra também se começava a agravar bastante), passadas as três primeiras semanas de efetivo combate ao novo coronavírus o retrato, possível, do panorama nas IPSS é bastante tranquilizador. É certo que têm existido casos, ainda assim pontuais, provavelmente outros surgirão, mas, pelo transmitido pelos dirigentes distritais, a situação é tranquila e, nesta altura, estava controlada. No entanto, dentre um manancial de problemas, dificuldades e preocupações, há uma unanimidade quanto ao desempenho dos trabalhadores das instituições, que de forma abnegada e muito solidária têm zelado pelo bem-estar dos utentes, colocando mesmo os cuidados aos utentes, sejam dos lares, sejam do apoio domiciliário, à frente das próprias famílias. “Os trabalhadores têm tido um papel incrível, um desempenho exemplar no sentido da entrega. Vestiram a camisola da solidariedade feita ação de uma forma muito empenhada”, referiu José Carlos Batalha, da UDIPSS Lisboa. Estar ao serviço já é um desafio, pois há o medo de contaminar utentes, mas também de contaminar o ambiente familiar, o que deixa muitos receosos. “Os trabalhadores têm-se esforçado. Há um pânico geral… As pessoas estão com medo, mas fazem o que podem. Sente-se que há mobilização dos trabalhadores, que mesmo sobrecarregados pela falta de pessoal e pelos turnos mais alargados tê feito um trabalho extraordinário. Sem este trabalho as coisas estariam muito piores. Tenho conhecimento de funcionárias que podiam ter alegado apoio à família, porque têm filhos, mas como têm retaguarda familiar, optaram por estar ao serviço”, sustenta Tiago Abalroado, da UDIPSS Évora. Para José Carlos Arede, da UDIPSS Aveiro, “os funcionários têm sido fabulosos e demonstra o espírito que se cultiva dentro das instituições”. Também na Guarda o sentimento é de grande solidariedade. “Há uma mobilização generalizada, com muita gente a fazer turnos de mais de oito horas. Tem havido muita compreensão dos trabalhadores e os que estão ao serviço desdobram-se bastante”, referiu Rui Reis, da UDIPSS Guarda. “Tem havido grande dedicação dos trabalhadores. Proativamente, houve muitas instituições que cedo implementaram o trabalho em espelho, com muitos trabalhadores a laborarem em contínuo”, adiantou o cónego Roberto Mariz, da UDIPSS Braga. Este é o cenário por todo o país, com as instituições a terem que se adaptar rapidamente a, por um lado, uma quebra de pessoal em virtude de algumas trabalhadoras terem ido para casa por causa dos filhos ou porque tiveram de entrar em quarentena, mas também no reescalonamento das escalas, que tem exigido muito mais dos trabalhadores que permanecem ao serviço. Há inclusive imensos casos em que as instituições reafetaram pessoal das valências de infância, todas fechadas, para o apoio aos idosos, especialmente no Serviço de Apoio Domiciliário, que por sua vez teve um crescimento de utentes pelo encerramento dos centros de dia e centros de convívio. “Somos todos uns heróis. Os colaboradores e os dirigentes estão todos unidos contra o inimigo comum. Mesmo na pandemia estamos preocupados e atentos para conseguirmos que os nossos utentes não sejam infetados”, afirma Maria de Lurdes Pombo, da UDIPSS Castelo Branco. “O que se passou em Espanha assustou… Temos trabalhadores 15 dias seguidos na instituição, para depois trocarem com outra equipa. Há gente a fazer um grande esforço, tem havido um vestir da camisola de forma muito empenhada”, reiterou Filomena Araújo, da UDIPSS Viana do Castelo. “As equipas estão muito motivadas. Os trabalhadores estão muito empenhados, mas há muito medo. No entanto, tem havido um reforço das boas práticas porque é necessário cuidar dos idosos”, afirmou, por seu turno, Paula Pimentel, da UIPSSD Bragança. “Há trabalhadores que têm que fazer o trabalho de dois ou três, mas tem havido um enorme espírito solidário. É um exemplo”, assevera Gil Tavares, da UDIPSS Coimbra. “Não há nada a apontar aos trabalhadores, estão de alma e coração nesta luta. Têm correspondido de uma forma exemplar e todos sabemos dos salários baixos que auferem. E há que não esquecer o acréscimo de horas que esta gente está a fazer que, depois, é preciso pagar… E as instituições não têm dinheiro”, alertou João Carlos Laranjo, da UDIPSS Portalegre. FALTA EPI Os relatos dos dirigentes distritais das uniões distritais das IPSS é a prova de que a situação em Portugal tem estado bastante calma, comparando com outras aqui bem perto, porque na linha da frente estão também as instituições e os seus trabalhadores, que têm impedido ao máximo que os idosos a seu cuidado engrossem as listas de infetados e inundem os hospitais. “As IPSS, como é hábito em crise, sabem responder e têm gente empenhada e trabalhadora, sempre pronta a ajudar os outros”, lembrou José Costa, da UDIPSS Viseu. No entanto, este tem sido um combate travado com bastantes dificuldades. Se o empenho e dedicação dos trabalhadores das IPSS tem sido enorme em todo o país, transversal a todos os distritos é a falta de testes, a falta de Equipamento de Proteção Individual (EPI) e também a carência de recursos humanos. Ainda antes de as autoridades o aconselharem, muitas IPSS por este país fora já tinham implementado os seus planos de contingência. Muitas já haviam suspendido as visitas. Este trabalho preventivo, com o desdobramento das equipas, a transferência de pessoal da infância para os idosos e todo um sem número de adaptações que as instituições fizeram para se proteger. Contudo, o lamento é geral pela falta de testes, o que serviria para mais rapidamente se detetarem infetados e potenciais contaminadores. Mantendo-se os ambientes residenciais protegidos, o perigo surge da indispensável entrada e saída dos funcionários. A generalidade dos responsáveis distritais com quem o SOLIADRIEDADE falou transmitiram isso mesmo. É preciso testar o máximo possível para evitar que o vírus entre e se espalhe nas instituições. E para que a proteção de utentes e trabalhadores seja o mais eficaz possível são necessários EPI. Em todos os distritos as instituições clamam por material de proteção individual. É sabido que muitos lares, não sendo hospitais, prestam um sem número de cuidados médicos aos seus utentes. Nesta fase, a proteção nas Estruturas Residenciais Para Idosos (ERPI), nos Lares Residenciais e nas Unidades de Cuidados Continuados (UCCI) é essencial, pois são grupos de risco que ali habitam e, à semelhança do que já aconteceu em Espanha, podem ser um fornecedor muito ativo de número para as listas de mortalidade, mas também para as dos hospitais. Em Portugal até à segunda semana do estado de emergência os hospitais ainda não tinham entrado em rutura, porque as instituições têm sido um grande tampão. Esta situação torna-se pertinente porque há muitas instituições que, pela sua dimensão, não conseguem trabalhar em espelho, ou seja, ter uma equipa de prevenção em casa e outra a laborar em contínuo. “Os testes não chegam e com as pessoas a entrar e a sair das instituições torna-se perigoso”, alertou João Carlos Laranjo, que apontou ainda outra situação que preocupa as IPSS: “Os voluntários e destacados do Centro de Emprego são testados antes de irem para as instituições ou não? É preciso rigor, senão as instituições não querem essas pessoas”. Como muitos dirigentes referiram, as instituições não têm grandes stocks de EPI. Têm-nos para as necessidades correntes, umas mais do que as outras. Com a necessidade do momento, por todo o país o mercado não está a responder e, muitas vezes, responde de forma especulativa. “Um artigo que dantes custava dois euros, agora pedem-nos 20 euros”, lamentou Nuno Farinha, de Beja. “Os EPI é que são o calcanhar de Aquiles das IPSS. Temos que estar a comprar a preços exorbitantes”, reclamou José Carlos Arede. Para Borges Machado, da UDIPSS Vila Real, é necessário encontrar soluções para fornecer as instituições de EPI, mas também “dar formação às direções técnicas e trabalhadores de como vestir e despir os equipamentos corretamente e em segurança”. Por outro lado, a aquisição extraordinária de EPI vai, com certeza, levantar problemas financeiros às instituições e os seus dirigentes estão já bastante preocupados com isso. Muitos referem o facto de a situação das instituições antes da Covid-19 já não ser boa e que, obviamente, será agravada com esta situação. A este investimento inesperado e avultado junta-se um outro problema que muitas IPSS já estão a começar a sentir. Com a obrigatoriedade de suspensão das respostas para a infância e juventude e com as crianças em casa, começa a colocar-se o problema das mensalidades das creches, infantários e ATL. “Há instituições a queixar-se porque há pais que não querem pagar as mensalidades”, revelou Eduardo Mourinha, da UDIPSS Santarém. A UDIPSS Lisboa recolheu dados junto das suas associadas e, com menos de 50% de respostas ao inquérito, o prejuízo é de cerca de três milhões de euros. “Antes da Covid-19 já muitas instituições estavam em perigo. Agora, se o pilar das famílias falhar, a casa vai abaixo”, asseverou José Carlos Batalha. Ainda assim, a sociedade tem-se mobilizado e tem tentado ajudar. No distrito de Leiria a indústria, de têxtil e de plásticos, está a adaptar a sua produção para produzir material de proteção. Em Beja, há fornecedores de produtos que as instituições habitualmente gastam e que os estão a oferecer para que elas possam canalizar os seus recursos para a aquisição de desinfetante, luvas, e demais EPI. Também as autarquias têm estado bastante disponíveis para apoiar as instituições. Umas mais do que outras, mas há exemplos muito elucidativos, como o da Régua, em que o município comprou testes para rastrear todos os trabalhadores e utentes de todas as IPSS. Muitas outras já prepararam espaços de retaguarda para a necessidade de transferir utentes para desinfeção dos equipamentos sociais. Outras têm fornecido EPI. Também na sociedade civil há a noção de que as IPSS são um elemento essencial na luta contra a Covid-19 e que proteger aquelas que elas cuidam e acolhem é essencial para manter a curva achatada, adiando o máximo possível que o novo coronavírus entre nas instituições. O que, diga-se, seria algo devastador. Esperança, força, confiança, resiliência, muita resiliência, ânimo, cautela, solidariedade, união e coragem são as palavras mais usadas pelos dirigentes distritais com quem o SOLIDARIEDADE falou na construção das mensagens que enviam para todos os dirigentes, trabalhadores, utentes, famílias e comunidade em geral. “Resiliência. As instituições têm que aguentar. Este é um sector muito importante na sociedade portuguesa, porque se as instituições fecham o país vai para o buraco”, argumentou Eduardo Mourinha. Bom seria, como afirmou Maria de Lurdes Pombo, era “que o vírus não se lembrasse de nós nas instituições”. Até ao momento, as IPSS têm estado à altura do desafio, os poucos casos que houve no seu seio são pontuais, mas a luta ainda agora começou, pois trata-se da população mais frágil e mais afetada pela Covid-19. É uma luta sem tréguas, frente a um inimigo invisível e letal, que atenta contra a nossa memória e a nossa sabedoria enquanto país: os nossos mais velhos. Pedro Vasco Oliveira (texto e fotos)